O diretor Krzysztof Kieslowski proclamou que "A Igualdade é Branca". Claro que, seguindo a tônica adotada na sua trilogia das cores, Krzysztof está sendo irônico. Seu filme procura mostrar o quão discriminadora e geradora de desigualdades ainda é a moderna sociedade Francesa (assim como a Européia em geral) 200 anos depois que os idealistas revolucionários proclamaram o lema "Liberdade, Igualdade, Fraternidade".
Já percebeu que na nossa sociedade ocidental a idéia do branco e do claro está geralmente associada ao perfeito e desejável, ao contrário do preto e do escuro que dão a idéia de imperfeito? A pessoa culta e instruída, por exemplo, é chamada de iluminada, enquanto que o que não chegou a um grau ou tipo de instrução considerada desejável é visto como mergulhado em trevas (a palavra aluno vem do latim alumni que significa o que está sem luz). Do mesmo modo, a pessoa que possui dignidade ou autoridade para algum posto ou função é ilustre e aquele que deseja alcançar tal condição por processo classificatório ou eletivo precisa se apresentar como candidato (do grego, aquele que está livre de manchas, que está com vestes brancas).
É óbvio que existem origens psicológicas para essa associação de branco e luz com bom e perfeito e isso não é em princípio discriminatório. Nós, humanos, somos uma espécie de hábitos diurnos, altamente dependentes do sentido da visão e profundamente propensos a associações inconscientes e emocionais com cores e sons (como na música). Mas o problema está ao extrapolarmos esse nível para construções conscientes e sociais que diferenciam pessoas e comunidades de acordo com a luz intelectual ou moral que possuem, a cor que usam ou apresentam na pele ou a música que ouvem ou produzem. E é nessa hora que reproduzimos o racismo em nossas vidas e somos capazes que dizer absurdos como "o fulano é negro mas tem alma branca".
Então vamos voltar ao excelente filme de Krzysztof que citei no princípio deste texto e dizer, certo de que o diretor não discordaria de mim, que a igualdade não é branca. Nem azul. Nem vermelha. E nem mesmo é preta. Pois quando falo de igualdade não estou me referindo à aparência das pessoas mas à dignidade. A igualdade é igual. E ponto.
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