Na Grécia Antiga eram conhecidos como sofistas os sábios com grande habilidade retórica, muitas vezes políticos e pedagogos (aqueles ofereciam serviços de ensino e treinamento em filosofia e retórica para quem estivesse disposto a pagar por isso). Platão, seguido da maior parte dos filósofos até aos nossos dias, enxergava a atividade dos sofistas uma perversão voluntária do raciocínio demonstrativo para fins pessoais, duvidosos e, porque não dizer, ideológicos. Segundo Platão, o sofista era "um impostor, caçador interessado em jovens ricos, comerciante didático e atleta no combate verbalístico ou erístico, purificador de opiniões" e, também, um "malabarista de argumentos, mais verossímeis do que verdadeiros, mais sedutores do que plausíveis.”
Não se tratavam de pessoas que não conhecessem bem a lógica e a filosofia. Ao contrário, sofistas eram verdadeiros sábios e habilidosos filósofos que, para benefício próprio ou de seus educandos, se utilizavam de suas grandes habilidades retóricas para convencer interlocutores menos treinados. Técnica essencial para um político que queria fazer uma carreira de sucesso.
O que mais incomodava Platão (que, assim como seu discípulo Aristóteles, primava pela correta observação das regras da lógica) era a tese defendida pelos sofistas segundo a qual não há diferença significativa entre o verossímil (o que não é verdade, mas aparenta ser) e o verdadeiro. Para o sofista, se um argumento aparenta ser verdadeiro, se pode ser fundamentado por uma boa retórica, é tão verdadeiro quanto qualquer outro que possa do mesmo jeito ser sustentado. O sofista é a expressão filosófica do político inescrupuloso.
Uma das artimanhas usadas pela técnica sofística é o uso de uma lógica deformada. O sofista e, em especial, o político habilidoso que usam esse artifício sabem bem onde querem chegar, pois, para atingir seus objetivos e convencer o interlocutor, lançam mão de um raciocínio falho que normalmente rejeitariam se ouvissem de outros.
Um exemplo excelente de sofisma é o raciocínio usado esta semana pelo Ministro das Relações Exteriores Antonio Patriota, eficiente porta-voz do Governo Federal quando o assunto é justificar os apoios que o Governo do PT presta a algumas das mais escandalosas ditaduras do mundo ("hay oposición a los Estados Unidos, soy a favor"), para chegar à conclusão de que a Venezuela de Hugo Chavez é uma democracia: "há uma oposição organizada lá, o que mostra que a Venezuela é uma democracia". Uma pérola do sofismo.
Sabemos bem que não há democracia sem pluralidade partidária e liberdade política. Mas porque esse meu raciocínio é verdadeiro? Simplesmente porque "democracia" é, como diz a palavra, o "governo do povo" e o povo não é homogêneo. Ou seja, para ser governo de todo o povo, a democracia precisa providenciar liberdade de expressão para todas as opiniões, com liberdade e igualdade. Há um claro consenso de que na década de 70 o Brasil não vivia uma democracia porque, embora houvesse uma oposição organizada (existia um partido de oposição chamado MDB) e houvesse eleições, era óbvia a perseguição que o governo federal e a cúpula militar fazia contra qualquer um que se tornasse um problema. Pessoas eram presas, opositores eram exilados, empresas eram fechadas, jornais e outros órgãos de imprensa eram censurados, artistas eram vigiados. Isso não é democracia...
Nosso inteligente Ministro sabe bem que a simples existência de um partido de oposição e de eleições não faziam do Brasil uma democracia na época militar. Mas parece não lembrar disso quando diz que a Venezuela, que fecha emissoras de televisão e oprime opositores, é uma democracia. Só "parece" esquecer, pois nosso sábio ministro sabe bem que o bom sofismo é o que "parece mas não é" verdade.
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